O segredo da felicidade dos islandeses: por que este
país, à deriva no congelante Atlântico norte, está sempre no topo dos
rankings de felicidade no mundo?
Por Eric Weiner, BBC -
Há muitos anos, visitei a Islândia no meio do inverno. Eu estava fazendo a pesquisa para um livro sobre felicidade global, e a pequena nação nórdica me intrigava.
O que esse país, à deriva no congelante Atlântico norte, estava fazendo no top dos rankings de felicidade no mundo?
Em busca de respostas, interroguei qualquer pessoa
disposta a falar, jantei harkls – ou tubarão podre – bebi demais e,
claro, tomei um banho na Blue Lagoon (Lagoa Azul), as águas geotermais
de outro mundo que se tornaram sinônimo da felicidade islandesa.
Pouco depois de eu ir embora, os maiores bancos da
Islândia quebraram e a economia do país chegou à beira do colapso como
efeito colateral da crise financeira de 2008.
A taxa de desemprego se multiplicou por oito. A confiança em instituições, como bancos e o Parlamento, despencou.
Supus que felicidade do país também iria derreter.
Mas eu estava errado.
“A crise econômica teve um efeito limitado na felicidade“,
de acordo com a cientista de saúde Dora Gudmundsdottir, autora de um
estudo publicado na revista científica Pesquisas de Indicadores Sociais.
Não apenas a felicidade geral da população teve
apenas uma pequena oscilação durante a crise como 25% dos islandeses
disseram que estavam ainda mais felizes. Como isso ocorreu?
Mandei um e-mail para Karl Blöndal, editor de um jornal que eu havia conhecido em Reykjavik. “Muitas
pessoas foram fortemente atingidas, aposentados perderam sua poupança.
Mas uma de comunidades pequenas é que todo mundo que você conhece está a
seu alcance“, explicou.
“Aqueles que perderam seus empregos não estão isolados, o risco de alienação não é o mesmo que seria em sociedades maiores.”
Ali estava uma verdade essencial sobre a felicidade islandesa: é majoritariamente um empreendimento coletivo.
A Islândia,
apesar de ter uma capital cosmopolita como Reykjavik, lembra uma
pequena cidade em muitos aspectos. As pessoas não precisam se preocupar
em “cair num buraco negro”, dizem eles, porque não há buraco negro para
cair; sempre há alguém para te pegar.
Como me disse um imigrante americano, se seu carro
está preso na neve, sempre (sempre mesmo) alguém vai parar para te
ajudar. Os níveis de confiança são tão altos que não é raro ver uma
criança de seis anos andando sozinha para a escola na escuridão do
inverno.
Em uma declaração tipicamente islandesa e otimista, Blöndal ainda viu uma oportunidade dentro da crise.
“Agora podemos limpar o Estado. Quem sabe isso
seja uma oportunidade para forjar uma sociedade mais aberta, onde o
poder é mais difuso e os antigos interesses pessoais e barreiras
econômicas estejam fora do caminho.”
A ideia de uma sociedade justa e aberta parece ser a chave.
De acordo com um relatório recente da ONU sobre felicidade global, a felicidade é distribuída de forma equilibrada na Islândia.
Ou seja, a maioria dos islandeses é mais ou menos
igualmente feliz, enquanto em outros países – principalmente na América
Latina e no Oriente Médio – a felicidade varia muito.
Isso é importante porque novas pesquisas mostram que “as pessoas são significativamente mais felizes onde há menos desigualdade de felicidade“.
Em outras palavras, não é possível ficar muito
feliz se seu vizinho está muito triste – e os islandeses parecem
reconhecer intuitivamente essa verdade essencial.
Eles também desenvolveram um forte senso de resiliência com séculos de privação e isolamento.
Pense na escuridão do inverno, erupções vulcânicas e
no terreno tão inacreditável que a Nasa enviou os astronautas da missão
Apollo, em 1965, para treinar ali para suas caminhadas lunares.
Você vê esse tipo de otimismo teimoso todos os dias na Islândia.
Você vê no jeito que as pessoas nadam em piscinas abertas, o ano todo,
ou em como não há nenhum estigma ligado a deixar um emprego ou um
relacionamento ruim.
Essa resiliência também pode ser encontrada na rica
cultura literária do país, que data das antigas sagas – contos Viking
de heroísmo frente à adversidade.
Hoje, a Islândia
publica mais livros per capita do que qualquer país do mundo.
Alguns
psicólogos acreditam que a literatura – e outras fontes culturais –
servem como um amortecedor em tempos difíceis.
As histórias são um veículo para expressar dor, e a
dor que se expressa é uma dor menor. Também são um meio para uma
cultura expressar sua energia criativa.
E os islandeses certamente reconhecem o valor da
palavra escrita, atitude refletida em um ditado popular islandês:
“Melhor ir descalço do que sem livros”.
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