Por Marcelo Zorzanelli, DCM -
Qual é a diferença entre estas duas situações? Número um:
juntar-se à turba que grita “lincha, lincha” frente ao suspeito de um
crime numa comunidade em que a lei não chega; ou, número dois: na
internet, juntar-se a uma tese improvisada sobre por que tal figura
pública deve merecer a morte (ou coisa pior) por ter comentado “de forma
errada” uma tragédia recente.
Até onde
entendo, a diferença entre os dois é que os linchadores tiveram mais
tempo para pensar se estavam sendo justos (demora para achar os paus e
pedras indicados à tarefa).
O exemplo parece exagerado para quem faz a crítica na internet, claro, mas deve ser um eufemismo para quem apanha do outro lado.
Para já,
precisamos como sociedade de um novo conjunto de regras para lidar com
os escorregões de outrem; tochas e tridentes deste tribunal neurótico
não estão ajudando ninguém.
Mesmo alguém
que foi analfabeto digital até as 10h da manhã já aprendeu uma coisa:
vivemos em busca de atenção na internet e este é o
inimigo que motiva a banda dos que ofendem sem convicção e dos que caem de pau sem muito da mesma.
O sujeito que fala a besteira na tentativa de se diferenciar e o outro
que “lacra” posando de herói da moral querem a mesma coisa: atenção.
Antigamente, no
mundo real, o jogo era de provocação; espetava-se o coleguinha, que era
alguém de quem já se tinha previamente alguma ideia, com alguma
sentença fabricada para a polêmica. A coisa toda terminava em baixaria,
troca de acusações extemporâneas, às vezes socos na cara ou semanas,
meses sem se falar. Mas, por fim, as partes aprendiam alguma coisa.
Hoje, a
instituição conhecida como “a opinião das redes sociais” entra em
imensas colisões frontais sem se preocupar em puxar as fichas ou anotar
as placas para conferência posterior.
Vivemos num
ambiente que mistura tudo: os que muito têm e os que nada têm a perder.
Acaba que o ambiente cínico das celebridades em que a compaixão é uma
commodity se torna a bússola moral do usuário médio. Faz parte do
protocolo, do marketing, ser legal. Um esclarecimento pessoal: acho que
devemos ser generosos e decentes, por tudo que há de mais sagrado. Mas
sem pressa para crucificar este ou outro. Afinal, quem confere, caso a
caso, se quem escorcha a vítima da vez faz o seu dever de casa? Para
ficar no clichê, você dá bom dia para o seu porteiro?
Diga: quais as
lágrimas reais? Melhor, existe regra para o luto alheio? “Hoje, morreu
mamãe, Ou talvez, ontem, não sei bem”, abre-se a novela “O Estrangeiro”,
do argelino Camus, uma das obras-primas sobre tudo que há de mais
absurdo na vida. Se você olhar no manual da internet, está proibido de
ser o existencialista Meursault.
Antes de usar a
“moral vigente das redes sociais” para machucar o coleguinha, sugiro
reparar que o outro existe e é o que se convencionou chamar de “irmão
humano”. Sim, cabe lembrar que ele é o desconhecido que amanhã “poderia
estar lá”.
Ja está muito
longa a crônica, mas preciso registrar algo. Enquanto as redes
brasileiras se afogam hoje num buraco de mesquinharia e homenagens de
pau oco, recomendo a atitude dos insuspeitos cartolas da cidade que deu
ao mundo Pablo Escobar. Eles decidiram pedir à Conmebol que dê à
Chapecoense o título (mesmo que isso não dê em nada, o que é provável),
mas não só: disseram a nós, seus irmãos, que para os livros de história,
“de nossa parte, e para sempre, Chapecoense é campeão da Copa
Sulamericana 2016”.
Precisamos
de mais frases generosas assim, geradas de susto da tragédia mas
gravadas no mármore da História e menos posts persecutórios e infelizes
gravados em bytes.
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